quinta-feira, 1 de maio de 2008

O que era Ficção


ARMAZÉM LITERÁRIO

Autores, idéias e tudo o que cabe num livro

E-BOOKS
Marcel Plasse

"Indústria editorial aposta tudo nos e-books", copyright O Estado de S. Paulo, 31/01/01

"Imagine um mundo sem livros. Não uma ficção científica sobre um mundo sem livros, como Farenheit 451, de Ray Bradbury, que François Truffaut transformou em clássico cinematográfico nos anos 60. Microsoft, Adobe e Xerox estão ajudando a criar esse futuro. E tem o apoio de editoras renomadas, como Barnes & Noble, Penguin Putnam, Simon & Schuster, St.

Martin's Press, Warner Books e Harlequin.

Bem-vindo ao século do e-book. Embora o primeiro aparelho de leitura de livro eletrônico tenha sido lançado em 1998, a indústria editorial resolveu apostar, na virada do milênio, que o formato vai substituir o livro de papel em duas décadas. Entusiasmada, já criou quatro prêmios específicos para a produção literária voltada ao meio - The Electronic Literature Awards, Frankfurt E-Book Award, os Eppies e o Independent E-book Awards.

Muito desse entusiasmo foi alimentado pelo hype em torno de Stephen King, que se transformou em garoto-propaganda da literatura na Internet ao decidir publicar um livro diretamente na Web, sem intermediação de uma editora. Naif diante da atual investida do mercado, a idéia de King era vender capítulo por capítulo, escrevendo enquanto os fãs continuassem a pagar pela leitura.

No entanto, quase 50% dos fãs que pagaram pelo primeiro episódio desistiram do livro antes do capítulo seis. No sétimo, King deixou o restante do público, que desembolsou US$ 7 para ler o início de The Plant, sem saber como a história termina. Aconselhado por seu agente, o escritor interrompeu a produção da obra para se dedicar a trabalhos mais lucrativos - três livros para editoras tradicionais.

A ironia é que King, ao lançar-se na experiência amplamente divulgada pela mídia, brincou que talvez The Plant se tornasse o pior pesadelo do mercado editorial. E, realmente, a iniciativa criou o receio de que, caso bem-sucedida, fizesse outros escritores best sellers perceberem como poderiam ganhar dinheiro sem a intermediação das editoras. A realidade, porém, é que King entusiasmou poucos escritores, a maioria independentes, a publicar na Web por conta própria. O mundo sem livros não deverá ser, nos prognósticos da indústria de entretenimento, um mundo sem editoras.

Engenhocas - O hype, de todo modo, inspirou iniciativas de autores em todo o planeta. No Brasil, o colunista do Estado Mario Prata foi pioneiro, ao escrever na Web o romance Os Anjos de Badaró, que será publicado pela Editora Objetiva. Mas o livro eletrônico que o mercado celebra, aposta e investe não brilhará na Web. Graças à convergência de interesses entre fabricantes de hardware, software e grandes editoras, a literatura do futuro só usará a Internet como meio de distribuição (download). Livros já estão sendo baixados de sites diretamente para novas engenhocas de leitura digital. Esses aparelhos é que são os e-books autênticos.

Há um consenso não declarado de que o computador nunca se tornará um lugar adequado para a leitura de livros, mesmo que eles tenham sido produzidos para a Internet. Isto se deve ao costume dos leitores de ler em qualquer lugar, seja na praia seja no transporte público. O advento dos PDAs e PocketPCs introduziu o conceito dos computadores com o tamanho de livros, que podem ser levados para toda a parte. Daí para o e-book, bastou uma idéia.

Com a tecnologia então existente, a empresa norte-americana Nuovomedia lançou o seu Rocket E-Book há dois anos, por US$ 200 a unidade. O que parecia idéia de loucos - minicomputadores apenas para leitura - chamou a atenção de capitalistas da era Nasdaq. E, hoje, os sucedâneos do REB original chegam a custar US$ 700, atraindo interesse de grandes empresas de software e do mercado editorial. Resultado: os ainda antiquados e-books do século 20 fecharam o ano com 40 mil unidades vendidas. Nada mal para um produto que até recentemente era ficção científica da série Jornada nas Estrelas.

O Natal de 2000 nos EUA demonstrou o ímpeto com que os e-books serão marqueteados ao longo do ano-novo. Em primeiro lugar, a oferta de títulos disponíveis para download revelou uma estratégia de privilegiar best sellers - títulos de Stephen King lideraram as listas de ofertas, ao lado de publicações de Ken Folett, Robert Ludlum, Patricia Cornwell, Joyce Maynard, Michael Cunningham, Hemingway e a Bíblia. Detalhe: Ridding the Bullet, de Stephen King, vendeu 400 mil cópias pela Internet.

Se o mercado para autores consagrados parece promissor, novos autores estão se aproveitando da nova tecnologia para atingir o grande público. Um dos casos célebres é o de Douglas Clegg, ganhador dos troféus Bram Stocker e International Horror Guild, que costumava vender 20 mil cópias de seus livros nos EUA até descobrir o poder da Web. Seu mais recente livro, Purity, está sendo oferecido de graça para os fãs baixarem na rede. Purity chegou a ser vendido pelos meios convencionais. A edição em capa dura, disponível a US$ 30 o exemplar, esgotou em uma semana. É que, depois de começar a oferecer contos e romances pela Internet, Clegg virou um campeão de vendas, alcançando a média de 100 mil exemplares por livro publicado.

As festas de fim de ano também viram chegar às lojas maior variedade de aparelhos para baixar e ler livros da Internet - com baterias de até 40 horas de duração e capacidade de armazenamento de 4 mil páginas. O consumidor já pode optar por versões sofisticadas ou básicas. Os principais produtos no mercado norte-americano são sucedâneos do REB original, atualmente lançados pela Gemstar e fabricados pela RCA. O preço desses e-books varia entre US$ 290 e US$ 699, tendo como diferença apenas o brilho da tela. Numa manobra para dominar o mercado, a Gemstar fechou pacotes de download com as principais editoras dos EUA, concentrando-se em best sellers, o que desagradou profundamente aos novos autores e às pequenas editoras.

O inconveniente, por esses acordos, é que os livros seriam baixados pelo mesmo preço de suas edições de capa dura. Quer dizer, além de pagar caro pelo aparelho em si, o usuário terá de pagar o mesmo que um livro normal pelo direito de lê-lo no seu e-book. O negócio agrada às editoras, que dispensariam as gráficas e aumentariam suas margens de lucro. Mas dificilmente se tornará popular, mantidos esses preços.

Por outro lado, acaba de ser lançado pela Franklin Electronic Publishers o novo eBookman, um aparelho que está sendo vendido a US$ 130 e tem a vantagem extra de possuir capacidade multimídia. Além de permitir leitura de livros eletrônicos, o eBookman, que tem conexão direta com a Internet, baixa Mp3 e armazena bookmarks, mas é menor que os REBs e pior de ler.

Em fevereiro, a França também ganhará um e-book, batizado de Cybook, que terá o tamanho de um paperback e custará o equivalente a US$ 780.

Os diversos lançamentos representam a maior competição, o que, na lei da oferta e da procura, significa uma inevitável queda de preços antes mesmo do próximo Natal. Mas a principal novidade de 2001 estará nas mãos dos fabricantes de software. Por enquanto, os e-books amargam um atraso tecnológico que outras áreas da computação superaram há uma década. Para começar, sua tela esverdeada com letras escuras é péssima para leitura. Como um e-book pode ser ruim de ler? Problemão, que novos softwares da Microsoft, Adobe e Xerox pretendem resolver. Microsoft Reader e Adobe PDF Merchant são os primeiros programas desenvolvidos especialmente para facilitar a leitura de livros em aparelhos compactos. A Xerox, por sua vez, elabora um software para proteger a distribuição e os direitos autorais dos livros eletrônicos, o ContentGuard.

Desafio - O grande desafio dos próximos meses será dar aos e-books a desenvoltura da Web, com a possibilidade de se realizar pesquisas por palavra-chave, alterar a fonte do texto e seu tamanho, além de acrescentar links de hipertexto na leitura, coisas corriqueiras em qualquer browser da Web. Nada disso representa dificuldade intransponível para a indústria eletrônica. Na verdade, já tem gente contando os dias para ver a nova geração de e-books chegar às lojas e livrarias. E já se fala em e-magazines, as revistas que poderão ser baixadas e lidas na nova geração de e-books - lá por 2004, quando os experts estimam que esse negócio movimentará US$ 500 milhões em direitos autorais.

Retrato do otimismo com que o mercado editorial encara o novo filão, a editora norte-americana Rosettabooks prepara sua estréia sem nem ao menos um título original em seu catálogo. Em compensação, adquiriu o direito de publicação eletrônica de cerca de cem clássicos, entre eles Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley, A Escolha de Sofia, de William Styron, e O Príncipe das Marés, de Pat Conroy. Outros 500 títulos encontram-se em diferentes estágios de negociação. O que faz dela uma editora que já dispensa gráficas e papel para publicar livros.

O Brasil também entrou na tendência. A iEditora, fundada em abril, registrou durante o ano passado 19 mil downloads de livros em seu site - de um total de 400 títulos, entre eles publicações da Nobel e Melhoramentos. Esses números são impressionantes, especialmente porque os e-books ainda não são vendidos no País."

http://www.observatoriodaimprensa.com.br/artigos/al070220018.htm (01/05/08)

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